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A poluição invisível

Renato Sabbatini

A pior poluição não está nas ruas e nem é a gerada pelas fábricas. Não está, como se acredita, na água que bebemos ou no alimento que comemos. A pior poluição está onde menos suspeitamos, onde normalmente nos refugiamos das agressões do mundo externo. Ela está dentro de nossas próprias casas !

Essas informações surpreendentes foram levantadas recentemente por cientistas de uma entidade ambiental americana, a Environmental Protection Agency (EPA), e saiu em um número da revista de divulgação científica "Scientific American" (fevereiro de 1998).

Alguns dados já eram conhecidos, outros são realmente espantosos. Por exemplo, você sabia que uma das maiores fontes de poluição é o seu banho diário de chuveiro? Pois é: o cloro colocado para tratar a água se transforma em clorofórmio ao ser aquecido pelo chuveiro. Este é um agente altamente volátil, e que aspirado em pequenas concentrações diariamente, pode causar muitos problemas em pessoas sensíveis.

Outra fontes importantes de poluição invisível e inodora no ambiente doméstico são: os agentes de lavagem a seco (tricloroetileno), os pesticidas colocados em madeirames e no teto das casas para prevenir infestações de cupins, e os carpetes e cortinas (os carpetes, em particular, armazenam por muitos meses os agentes de limpeza, desinfecção e conservação, que são extremamente voláteis, tóxicos e também cancerígenos conhecidos). Os solventes usados nas ceras de assoalho, nos limpa-móveis e removedores também produzem efeitos poluentes sérios, ao se evaporarem depois de aplicados. Finalmente, os produtos de combustão incompleta (fumaça na cozinha, lareira, fornos e fogões com queimadores defeituosos) os ácaros, fungos e poeira nos estofados, tapetes, cortinas e camas contribuem bastante para um índice de partículas em suspensão em nível muito elevado (de cinco a 10 vezes maior no que fora de casa ). Para se ter uma idéia, uma criança pequena, por estar sempre muito próxima do solo, ingere cerca de 100 mg de poeira por dia. Com isso, ela aspira cerca de 110 nanogramas de benzopireno, o mais tóxico dos hidrocarbonetos aromáticos cíclicos, parentes do benzeno. Como a maior fonte de benzeno poluente é a fumaça do cigarro, isso eqüivale a fumar três cigarros por dia !

Mas o maior motivo seja mesmo o desconhecimento total da população com respeito a esses riscos, que poderiam ser afastados com algumas medidas muito simples de prevenção. A primeirissima delas é eliminar totalmente o fumo em casa, tanto dos moradores quando de visitantes. O fumo gera monóxido de carbono, partículas suspensas e cerca de 400 agentes voláteis, inclusive benzeno e outros cancerígenos, e afeta tanto o fumante ativo quanto os passivos. Outras medidas são intuitivas e já eram usadas, sem saber, por nossas avós: casa muito bem ventilada, muita limpeza com água fria e o velho sabão em barra, evitando os super-agentes de limpeza modernos; limpar tapetes, cortinas e estofados sempre no quintal ou área de serviço, etc. O uso consciencioso e freqüente de um simples capacho para limpar os pés diminui em até 100 vezes o nível de poluentes carregados da rua, como o chumbo e o cádmio. Os assoalhos não devem ser nunca de sinteco (enorme fonte poluidora, que persiste por anos após a aplicação). As tintas de paredes devem ser livres de pigmentos de chumbo. Evite ficar muito tempo dentro de automóveis estacionados em ambientes restritos. E assim por diante.

A ciência tem dessas coisas maravilhosas: quantas vezes ela não vai contra a nossa intuição, ou derruba "conhecimentos" que parecem ser tão óbvios e aceitos tão sem crítica ? As leis de proteção ambiental são altamente ilógicas, dizem os dois autores do artigo citado. Elas procuram controlar as fontes emitentes, e não a outra ponta, o ambiente onde estão as pessoas a maior parte do tempo. Ficar perto de uma copiadora xerox ou de uma impressora laser expõe a pessoa a um nível de ozônio milhares de vezes maior que o gerado pela poluição dos automóveis na rua. Sabia disso ? As equações se invertem: o governo americano, por exemplo, têm critérios rígidos para controlar a emissão de benzenos, identificando as fontes emissoras principais como sendo os automóveis (82 %), a indústria (14 %). As fontes domésticas respondem apenas por 3 % e os cigarros por 0.1 % Entretanto, quando se analisa ao nível do consumidor, 45 % da exposição ao benzeno é devida ao fumo, 36 % da inalação de vapores de gasolina, removedores domésticos, cola, ceras, etc., e 16 % de outras fontes domésticas. Apenas 3 % do benzeno que inalamos provém de fontes poluentes industriais.

Quem poderia dizer quantos problemas de saúde, aparentemente sem causa, estão sendo causados nas pessoas por essa poluição doméstica ? Deve ser um número considerável…




Publicado em: Jornal Correio Popular, Campinas, 22/5/98.

Autor: Email: renato@sabbatini.com

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