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"Dot Com Madness"

 

Renato Sabbatini

Estou escrevendo esta coluna nos EUA, onde estou em um congresso. A proximidade física me deu uma visão privilegiada do fenômeno social e econômico que os americanos estão chamando de "Dot Com Madness", ou, em bom português: a loucura do .com, que é o domínio normalmente atribuído para os sites de empresas na Internet (por exemplo, www.microsoft.com). A expressão se refere à inacreditável explosão de empresas voltadas à comercialização de produtos e serviços na Web, principalmente na área de comércio eletrônico. Para se Ter uma idéia: o governo federal tinha feito há cerca de um ano que o volume de negócios anual realizado através da Internet nos EUA estaria girando em torno de 300 bilhões de dólares em 2003. Recentemente, esses números foram revisados para 1 trilhão de dólares, ou seja, 15% do PNB americano. Isso é muito dinheiro, mas não é improvável, pois apenas uma empresa, a Dell Computers (www.dell.com), que vende apenas pela Internet (não tem rede física de distribuição e vendas), faturou 8 bilhões de dólares em 1999, ultrapassando a Compaq em vendas, e posicionando-se na primeira colocação do "ranking" dos maiores fabricantes de computadores do mundo. Outra empresa, a Cisco (www.cisco.com), que fabrica e vende equipamentos de redes de computadores, também vendeu outro tanto pela Internet, numa modalidade de venda eletrônica chamada "B-to-B" ("business-to-business") ou entre empresas. As outras formas de comércio eletrônico são o "B-to-C" ("business-to-consumer"), como é o caso da venda direta de livros, medicamentos, CDs, brinquedos, computadores, etc., (o exemplo clássico é a www.amazon.com, no Brasil, o site mais recente é o www.submarino.com.br); e o "C-to-C" ("consumer-to-consumer"), que atualmente é representada pelos sites de leilões eletrônicos, como o eBay (www.ebay.com) e, no Brasil, o Valeu (www.valeu.com.br).

As marcas da Dot Com Madness estão por toda parte na sociedade americana. Dois exemplos: no últmo número da prestigiosa revista de negócios "Fortune", mais de metade dos artigos e dos anúncios se referia a empresas da Internet. Os comerciais da tevê estão lotados de anúncios dessas empresas, também: lojas eletrônicas de brinquedos, de venda de seguros, de passagens aéreas e pacotes de turismo, de serviços de reparos domésticos, envio de encomendas, móveis e decorações, e muitas outras coisas mais. A diversidade e criatividade são impressionantes, assim como a quantidade de dinheiro que as empresas estão gastando, ironicamente, em canais convencionais de propaganda e marketing, como TV, revistas e jornais, outdoors, etc. A maior parte do orçamento das empresas baseadas na Internet é destinado ao marketing e propaganda. A revista "Fortune" cita até mesmo uma dessas empresas, que fatura 20 milhões de dólares por ano, e está gastando 50 milhões em propaganda. É um total contra-senso no chamado "mundo real", pois esse desbalanço é uma receita para o desastre em qualquer empresa. No mundo louco da Internet, entretanto, essa empresa terá uma valorização ainda maior das suas ações ao declarar que está gastando tanto dinheiro em marketing.

Boa parte do que está acontecendo é devido à sede dos investidores por ganhos muito rápidos na Bolsa de Valores americana. Empresas recém-lançadas, praticamente sem faturamento real, lançam suas ações no mercado de valores (o que é chamado de IPO, ou Initial Public Offering), e as mesmas se valorizam em 500% por dia. As que estão sendo mais procuradas pelos investidores são as empresas que desenvolvem soluções tecnológicas para o comércio eletrônico. Na área da saúde também tem ocorrido enormes valorizações, como a DrKoop (www.drkoop.com), que teve um milhão de dólares de faturamento no segundo trimestre de 1999 e 22 milhões de prejuízo, mas mesmo assim teve seu patrimônio acionário valorizado em 20 vezes. Os executivos e proprietários dessas empresas estão se tornando milionários com uma velocidade recorde.

E no Brasil? O mercado acionário e a maneira como as empresas são organizadas, e também o relacionamento com capital de risco ("venture capital"), que é a base da atual loucura americana, não favorecem esse tipo de explosão em nosso país. Mas, as empresas americanas estão começando a descobrir o nosso mercado, e muitas novidades acontecerão no próximo semestre.
 

Para Saber Mais

 



Renato M.E. Sabbatini é professor e diretor do Núcleo de Informática Biomédica da Universidade Estadual de Campinas, colunista de ciência do Correio Popular, e colunista de informática do Caderno Cosmo. Email: sabbatin@nib.unicamp.br

Veja também: Índice de todos os artigos anteriores de Informática do Dr. Sabbatini no Correio Popular.



Publicado em: Jornal Correio Popular, Campinas, 12/11/99.
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