Indice de Artigos

Cérebros artificiais

Renato Sabbatini

A ciência acha que o cérebro humano é o mais complexo objeto existente no universo conhecido. Ele é formado por cerca de 12 a 15 bilhões de células, interligadas por cerca de 3 trilhões de conexões. As suas funções superiores, como a inteligência, a cognição e a consciência, não existem em nenhum outro tipo de matéria viva, e desafiam, até hoje, os esforços de milhares de cientistas, de entender como elas funcionam.

O campo da Informática que procura desenvolver sistemas capazes de imitar tarefas intelectuais complexas, tais como a resolução de problemas, o reconhecimento e classificação de padrões, os processos indutivos e dedutivos, etc., chama-se Inteligência Artificial (IA), e foi desenvolvida a partir dos anos 70s.

Um dos avanços mais recentes e interessantes da IA é a tentativa de desenvolver “cérebros artificiais”, dotados de algum grau de inteligência, a partir do conhecimento de como o cérebro biológico é organizado internamente. Essas novas invenções são chamadas de “redes neurais artificiais”. Da mesma maneira que no cérebro, as redes neurais artificiais são organizadas na forma de um número de elementos individuais simples (os neurônios), que se interconectam uns aos outros, formando redes capazes de armazenar e transmitir informação provinda do exterior. Outra capacidade importante das redes neurais artificiais é a auto-organização, ou seja, através de um processo de aprendizado, é possível alterar-se os padrões de interconexão entre seus elementos. Por este motivo, as redes neurais artificiais são um tipo de sistema denominado conexionista, ou seja, no qual as propriedades computacionais são resultado dos padrões de interconexão da rede.

Atualmente, a maioria das redes neurais artificiais é implementada na forma de um software, em computadores seqüenciais ou paralelos. Assim, a sua estrutura é simulada através de técnicas matemáticas. Existem centenas de grupos de pesquisa trabalhando com as redes neurais, em todo o mundo, e os resultados já indicam que realmente um certo grau de “inteligência” (entre aspas, porque não sabemos como surge a inteligência, quanto mais imitá-la; por isso mesmo Inteligência Artificial é um termo paradoxal).

Por exemplo, um pesquisador dos EUA, Terry Sejnowski, ensinou uma rede neural a “falar”, da mesma maneira que uma criança. O sistema funcionava da seguinte maneira: a entrada da rede neural era fornecida na forma de textos escritos (palavras isoladas, divididas em suas partes elementares, chamados de morfemas). A saída da rede, por sua vez, estava conectada a uma placa sintetizadora de voz, que produz sons (fonemas), quando alimentada com códigos especializados. A rede neural foi treinada a associar os morfemas aos fonemas associados, e isso foi feito por um processo de correção de erros muito semelhante ao que uma mãe usa para corrigir as palavras balbuciadas pelos seus filhinhos. Depois de ficar uma noite inteira treinando, a rede neural foi capaz de enunciar corretamente 100 % de todas as palavras que aprendeu, e mais de 90 % de todas as palavras que ainda não conhecia !

Esse resultado fantástico, que foi mostrado em um programa da rede de televisão NBC, no horário nobre, convenceu muita gente que as redes neurais serão a próxima geração de computadores (no caso, a sexta geração), e muitos países passaram a investir centenas de milhões de dólares em pesquisas sobre redes neurais. Em consequência, existem hoje dezenas de produtos comerciais que usam essa tecnologia, como, por exemplo, um aparelhinho que reconhece se a assinatura de uma pessoa é válida, ao assinar um cheque ou outro documento qualquer. A rede neural analiza os movimentos da ponta da caneta, o tempo que leva cada floreio, etc. O sistema é altamente sensível à falsificações, pois um falsificador vai tentar fazer a assinatura ficar visualmente igual, mas o “ritmo” de desenho das letras é completamente diferente do dono verdadeiro da assinatura, que tem muito mais desenvoltura. É uma coisa muito bem bolada.

Ultimamente, as redes neurais artificiais sairam um pouco do noticiário comum, mas continua sendo uma fervilhante área de pesquisa em todo o mundo, inclusive no Brasil.


 

Publicado em: Jornal Correio Popular, Campinas, 07/01/97.

Autor: Email: sabbatin@nib.unicamp.br
WWW: http://home.nib.unicamp.br/~sabbatin Jornal: http://www.cpopular.com.br


Copyright © 1997 Correio Popular, Campinas, Brazil