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A telemedicina no campo

Renato M.E. Sabbatini

Um dos problemas mais sérios que afligem o setor saúde no Brasil é a enorme desigualdade de distribuição dos recursos de assistência médica no território nacional. De um lado, temos cidades progressistas, como Ribeirão Preto, dotadas de faculdades de medicina, odontologia, enfermagem, etc., que têm duas vezes mais médicos por habitante do que o preconizado como ideal pela Organização Mundial de Saúde, ou seja, cerca de 300 habitantes por médico. Do outro lado, há cerca de 2.000 municípios brasileiros sem contar com um único médico, hospital, ou posto de saúde. Isso é particularmente crítico nas comunidades rurais, onde a pequena densidade populacional e o baixo poder aquisitivo são fatores impeditivos à fixação do médico e do dentista. Mesmo quando existe um médico, ele é geralmente um clínico geral, capaz de atender apenas as ocorrências mais comuns de atenção primária de saúde, e que não tem recursos para intervenções mais complexas, como cirurgias de porte médio, problemas especializados de saúde. etc.

Isso não ocorre apenas no Brasil, evidentemente, embora aqui os problemas sejam agravados pelo subdesenvolvimento e baixo nível educacional e sócio-econômico da população. Em países ricos, como os EUA e o Canadá, com grandes extensões territoriais, e áreas rurais totalmente isoladas, o problema teve que ser equacionado e resolvido através de um sistema hierárquico, do qual participam médicos e enfermeiras rurais (pequenas clínicas junto a um aglomerado maior de fazendas e sítios), e pequenos centros de pronto atendimento e internação (hospitais rurais).

Atualmente, a Informática, e particularmente, a Telemática, estão se tornando auxiliares extremamente valiosos para o sistema de saúde rural. A aplicação mais utilizada é o correio eletrônico, que permite colocar em contato permanente o médico rural com seu hospital, e do hospital rural com um "hospital tutor", que é um hospital terciário de uma cidade grande (normalmente situada a centenas de quilômetros dos núcleos rurais clientes), ligado a uma universidade. A Internet pode ser utilizada pelos profissionais de saúde rural para consultar bases de dados, ler artigos, encaminhar dúvidas para especialistas médicos dos centros mais sofisticados, e discutir o caso de um paciente com um problema complicado. Deste modo, o profissional de saúde não se sente desamparado, nem desconectado do mundo e do progresso médico, que é um dos fatores que limita a atração dos centros rurais para os médicos recém-formados.

A telemedicina, que é o uso das redes de computadores e de telecomunicação para enviar informações sobre pacientes, permite o envio de imagens (radiografias, ultrassom, imagens microscópicas, foto do paciente, etc.), exames especializados (eletrocardiograma, dados de laboratório, etc) entre dois médicos ou centros, para que eles possam colaborar no diagnóstico e tratamento de um paciente. A Internet fornece uma solução simples e de baixo custo para a teleconsulta que não precisa ser feita em tempo real. Com isso, a Internet resolve 90 % de todas as necessidades da telemedicina, aumentando bastante a qualidade da assistência médica na zona rural. Um estudo feito na Itália mostrou que quase 30 % dos pacientes cujos dados foram enviados pela telemedicina para um centro médico mais sofisticado, tiveram a sua conduta (tratamento) modificada pelo médico rural, e que em 15 % dos casos, aproximadamente, o paciente foi removido para um centro mais sofisticado. Isso demonstra cabalmente o grande benefício da telemedicina rural.

Quando vários hospitais, consultórios, médicos, laboratórios, etc., estão interligados entre si, configura-se um novo e revolucionário conceito: o do hospital virtual, ou hospital distribuído, ou seja, um hospital que abrange uma enorme região geográfica, onde o trânsito de informação é feito através da rede de computadores. O Núcleo de Informática Biomédica da Unicamp está desenvolvendo o Hospital Virtual Brasileiro, que incorpora esse conceito, e que tem como objetivo proporcionar serviços de telemedicina de baixo custo, via Internet e o WWW.

No nosso país, esse tipo de recurso cabe como uma luva para melhorar o acesso à informação e interiorizar a Medicina através da tecnologia.


Publicado em: Jornal Correio Popular, Campinas,
Autor: Email: sabbatin@nib.unicamp.br
WWW: http://www.nib.unicamp.br/sabbatin.htm Jornal: cpopular@cpopular.com.br

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