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O virus no computador

Renato M.E. Sabbatini

Medo de vírus no computador já virou lugar-comum, embora muita gente ainda não tenha muita certeza do que exatamente ele é ou faz. Tudo bem, mas hoje o artigo não é sobre "vírus de computador", mas sim como as notícias sobre os vírus (reais e biológicos) se "espalham "pelas redes de computadores.

Um exemplo muitissimo interessante é o novo surto da febre de Ebola, uma doença hemorrágica de alta fatalidade que surgiu pela primeira vez no Zaire e no Sudão, em 1976, e que está gerando uma grande atividade noticiosa na rede, e ajudou muitissimo o esforço internacional para conter uma possível epidemia.

Uma organização internacional baseada em Boston, chamada SatelLife, por exemplo, foi uma das primeiras a levar antenas parabólicas para a região de Kikwit, no Zaire, onde apareceu a doença, em abril passado. Embora Kikwit não seja exatamente um vilarejo (tem mais de 150 mil habitantes, é um porto e centro industrial importante, e foi o centro administrativo do interior do antigo Congo Belga), não tem conexão à Internet, por isso a SatelLife correu para ajudar, como faz com países em desenvolvimento há vários anos. Ela paga canais de satélite para isso, e montou uma rede de computadores chamada HealthNet, em 16 países africanos e 5 asiáticos (quem quiser mais detalhes, pode contatar Kerry Gallivan, no endereço hnet@usa.healthnet.org). Poucos dias depois de ter sido confirmado o caso-índice da doença (o primeiro paciente identificado), a SatelLife já estava transmitindo boletins diários pela Internet a partir de Kikwit. A SatelLife foi fundada em 1989 pelo Dr. Bernard Lown, presidente da International Physicians for the Prevention of Nuclear War (Médicos Internacionais pela Prevenção da Guerra Nuclear), e que recebeu o prêmio Nobel da Paz in 1985.

A Internet está tendo um papel cada vez mais importante na identificação, investigação, pesquisa e discussão de novas doenças infecciosas que estão assolando o planeta (escrevi para o Correio Popular um artigo sobre o tema, na quinta-feira passada). Existem diversas listas de discussão sobre isso na Internet, e uma das melhores, que assino, e que me forneceu várias informações para este artigo, é a PROMED (Program for Monitoring Emerging Diseases). Ela foi criada em setembro de 1993, pela Federação de Cientistas Americanos, em um congresso em Genebra, Suiça, e é apoiada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), baseada naquela cidade. A PROMED é coordenada por dois cientistas de Nova Iorque, Stephen S. Morse, da Rockefeller University, e Jack Woodall, do Departamento de Saúde do estado, e é operada pela HealthNet.

Entre os assinantes da PROMED estão cientistas superfamosos na área de doenças infecciosas, como o Dr. McCormick, o único a estar presente nas três epidemias de Ebola anteriores à atual; o Dr. Karl Johnson, o primeiro virologista a descrever o vírus, e o Dr. C.J. Peters, que é o chefe do Laboratório de Contenção Máxima do Centers for Disease Control, a organização de pesquisa do governo americano que identifica o vírus responsável, e armazena amostras em uma geladeira-cofre-forte em Atlanta, nos EUA, onde estão guardados tubos congelados com os mais apavorantes e mortais micróbios descobertos pela ciência. Para se ter uma idéia do alcance e do impacto que a Internet está tendo sobre esta área, basta dizer que a PROMED tem mais de 700 assinantes em mais de 70 países. Uma de suas grandes utilidades é o fato que foi criada para identificar e responder rapidamente epidemias de doenças raras e proporcionar ajuda internacional às áreas afetadas.

Existem várias outras fontes de informação na Internet para quem quiser ler e se atualizar. Como divulgador científico, faço uso quase diário delas. Outro recurso que usei para escrever o artigo foi o servidor WWW da Organização Mundial da Saúde (endereço: http://www.who.ch). WWW é a World-Wide Web, ou teia de alcançe mundial, que é um sistema de servidores de informação ligados à Internet, que funciona usando softwares de multimídia, como o NSCA Mosaic. Usando o WWW, é possível ler publicações on-line que incluem texto, fotos, videos, som, etc. Pois bem, o servidor da WHO tem documentos com atualização diária (e, as vezes, até horária), sobre diversos tipos de doença, inclusive uma especial, sobre a febre de Ebola.

A partir de minha casa, em Campinas, em pouco menos de cinco minutos, acessei o WWW da Organização Mundial da Saúde, e fiquei sabendo tudo sobre quantas pessoas já tinham sido afetadas, quantas morreram, como estava o estado da quarentena na região, quais as recomendações da OMS para viajantes para aquela região, etc. Custo (para mim): zero. Este é um bom exemplo da filosofia de funcionamento e do poder inacreditável da Internet. Para poder ler aquela simples página de informação em minha casa, em questão de segundos foi feito o seguinte percurso, ida e volta: da minha casa para o computador VAX da Unicamp onde tenho minha área, dalí para o nodo de saída em São Paulo, na FAPESP, em seguida para a estação de satélite da Embratel em Mauá, via RENPAC, depois via satélite para a estação da Sprint em Washington, EUA; para o FermiLab em Chicago, volta para New York; pulo via satélite para Londres, novo pulo via satélite para Zurique, na Suiça, e daí pela SWISSPAC para Genebra, e finalmente, para o servidor da OMS. Ufa !


Publicado em: Jornal Correio Popular, Caderno de Informática, 29/05/95, Campinas,
Autor: Email: sabbatin@nib.unicamp.br
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