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A nova cartografia

Renato M.E. Sabbatini

Esta semana a prefeitura de Campinas anunciou uma interessante aplicação da Informática: usando uma técnica chamada geoprocessamento (GIS, em inglês: Geographical Information System), a Secretaria de Saúde vai montar um mapa digital da distribuição da mortalidade infantil na região, e correlacioná-la com outras variáveis socio-econômicas e populacionais. Graças ao sistema, os técnicos vão poder identificar, através de mapas coloridos, denominados mapas temáticos, se a mortalidade é maior onde não existe água encanada, por exemplo.

Como é feito isso ? Provavelmente os técnicos campineiros estão utilizando um dos numerosos softwares de GIS disponíveis atualmente. Para o setor da saúde existe um excelente software de domínio público, denominado EPI-MAP, que serve para obter mapas temáticos utilizados em epidemiologia, como esse exemplo da mortalidade infantil. Ele foi desenvolvido pelo CDC, o famoso Centers for Disease Control, localizado em Atlanta, nos Estados Unidos, e que é o órgão do Ministério de Saúde americano encarregado das estatísticas de Saúde. Como seria de se imaginar, o CDC é fortissimo na área de informatização de epidemiologia, sendo um dos mais avançados centros do mundo nesse aspecto. O EPI-MAP funciona de maneira muito simples: o usuário define inicialmente um mapa de uma região geográfica de interesse (o software já vem com muitos mapas pré-programados, mas é fácil colocar nele novos mapas, simplesmente fornecendo-se uma lista das coordenadas espaciais da região desejada). Em seguida, fornece um arquivo contendo dados epidemiológicos, juntamente com as coordenadas espaciais de onde eles ocorrem (por exemplo, mortalidade infantil de 17 por 1000 nascimentos observada em famílias do bairro do Cambuí). Basta isso. O programa tem sofisticados recursos de análise estatística desse dado, e pode produzir mapas temáticos em que os dados são representados por alguma cor ou tonalidade branco/preto. Aí acontecem algumas coisas interessantes. Por exemplo, se a mortalidade for representada em tons de amarelo, e a densidade de casas com água encanada for representada em tons de azul, as duas cores se superpõem em alguns pontos, e tons de verde (a mistura das duas cores) representarão uma correlação entre as duas variáveis !

O mapeamento temático não encontra aplicações somente em Saúde, é claro. Na realidade, as suas primeiras aplicações ocorreram na área de planejamento urbano, na prospeção geológica, na conservação ambiental e na agricultura. A aplicação que dá mais trabalho é o mapeamento temático urbano, pois muitas vezes é necessário digitar mapas detalhados de toda a infraestrutura da cidade, incluindo quarteirões, redes de água, luz e esgoto, etc. Uma vez feito isso, entretanto, apenas a imaginação dos técnicos limita os estudos que podem ser feitos. Aliás, Campinas é uma cidade pioneira na utilização desses sistemas de GIS há vários anos, através da competente atuação da IMA (Informática dos Municípios Associados), uma empresa estatal que cuida do processamento de dados do município. Utilizando sofisticadas estações de trabalho RISC de alta capacidade gráfica, e arquivos gigantescos contendo dados sobre toda a malha urbana de Campinas, os técnicos da IMA têm realizado um importante trabalho para modernizar a atuação do poder público.

A nova cartografia dos GIS se beneficiou enormemente de uma outra tecnologia muito interessante, que é a do mapeamento por satélites. Antes da existência dos satélites artificiais capazes de obter imagens de alta resolução da Terra, como o francês SPOT, um dos mais sofisticados, isso só podia ser realizado através de fotografias feitas por aviões especializados. Esse processo, denominado aerofotogrametria, era bastante detalhado (na década dos 80 o território brasileiro foi inteiramente fotografado dessa maneira), mas extremamente laborioso. Além disso, como a paisagem geográfica e urbana muda continuamente, era impossível atualizar com freqüência as imagens. Isso tudo mudou com os satélites de sensoriamento remoto, como são chamados. O SPOT, por exemplo, pode obter imagens com resolução de 10 metros (ou seja, objetos com até 10 metros de comprimento aparecem na imagem), e uma nova geração de satélites comerciais pretende decuplicar essa resolução (os satélites espiões militares conseguem muito mais do que isso: por exemplo, ler a placa de um automóvel a 300 km de altitude !).


Publicado em: Jornal Correio Popular, Caderno de Informática, 13/12/94, Campinas,
Autor: sabbatin@nib.unicamp.br
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