Efeito placebo

16/05/2004

Há sete anos, a auxiliar de escritório Vanessa Morila, de 23 anos, estava à beira da morte. "Em 1997, eu descobri que estava com uma aplasia medular, que é uma doença na medula, onde a medula deixa de funcionar. Eu precisava de um transplante urgente, um transplante de medula óssea".

As plaquetas, componentes do sangue que fazem a coagulação, tinham chegado a níveis baixíssimos e fatais. "Descobri que estava doente devido a vários sangramentos que estavam ocorrendo diariamente na gengiva, no nariz... Era direto".

Vanessa procurou um especialista em doenças do sangue. Ela saiu do consultório direto para o hospital. "A residente chegou e me perguntou se eu tinha irmãs. Eu falei: 'Tenho duas'. Ela falou: 'Que bom, então você vai precisar fazer um transplante, senão você tem só três meses de vida'", comenta Vanessa.

O tratamento era muito agressivo. Vanessa, na época com 17 anos, engordou 20 quilos! Para piorar, ninguém na família tinha medula compatível com a dela. "Foi aí que, no auge do desespero, nós procuramos uma medicina alternativa, no caso a homeopatia, que foi a minha salvação".

O médico homeopata retirou, aos poucos, os remédios convencionais. Vanessa continuou indo ao hematologista, mas nunca contou a ele que também usava  homeopatia. Hoje, a contagem de plaquetas é de quase 100 mil por milímetro cúbico: um pouco abaixo do normal, mas muito melhor do que na fase mais grave da doença.

Vanessa diz que já teve 7 mil plaquetas no sangue - seu nível mais baixo. Hoje, ela se considera curada."Completamente curada!", enfatiza.

Um caso tão marcante como o da Vanessa parece prova incontestável de que a homeopatia funciona. Mas não é bem assim. Primeiro, porque não se faz ciência com casos isolados - e Vanessa pode ser apenas uma feliz exceção. Segundo, os pesquisadores dizem que é muito difícil estabelecer uma relação direta de causa e efeito, ou seja, dizer com certeza absoluta que a recuperação de pacientes como Vanessa se deve exclusivamente por causa do remédio homeopático.

"Uma coisa que não engana somente os homeopatas, mas também os médicos que eles chamam de alopatas, quer dizer, a medicina moderna, é ter uma doença, tratá-la, e achar que foi o tratamento. Isso não é necessariamente verdade".

Se não foi o tratamento, então foi o quê? Crítico agudo da homeopatia, o fisiologista Renato Sabbatini tem uma resposta surpreendente para uma pergunta direta: "A homeopatia funciona?" "Sim, a homeopatia funciona, mas não pelos motivos que os homeopatas alegam".

Por que funciona, então? Na visão da medicina tradicional, por três motivos. O primeiro deles: o curso natural da doença. "Há situações práticas em que, se você tratar ou não tratar em três ou quatro semanas, o próprio organismo se cura", afirma Sérgio Ferreira, professor de Farmacologia da Universidade de São Paulo (USP).

"Os casos na área dermatológica, gastrintestinal, febre ou infecção são doenças normalmente bastante sensíveis à reação do organismo, e também bastante sensíveis à esfera psíquica", explica Renato Sabbatini, que também é professor da Unicamp.

Segundo motivo: as consultas aprofundadas, de mais de uma hora, típicas da homeopatia."Em uma consulta de homeopatia, não perguntam o que você tem, mas sim como como vai a sua vida", diz o músico Frejat. "É como se eles vissem um ideal de medicina sendo praticado, e, no fim, o detalhe do medicamento é só um detalhe'', considera o professor Renato Sabbatini.

Terceiro motivo: o efeito placebo. "Os estudos científicos homeopáticos são frágeis. Agora, funciona? Isso é que é difícil entender. Nós sabemos que existe o efeito placebo", diz Sérgio Ferreira.

O efeito placebo é um dos fenômenos mais poderosos e intrigantes da medicina. Ele acontece quando alguém toma um remédio de mentira - sem saber que é de mentira - e mesmo assim fica melhor. Para os críticos da homeopatia, está resolvido: remédio homeopático, sempre superdiluído, praticamente só água, não passa de placebo.

Mas, então, como os críticos explicam isso? Em uma fazenda de produção de leite em Jundiaí (SP), há três anos, só se usa homeopatia.  Até em spray! "Elas não entrava no cio, não emprenhavam e tinham alguns problemas nutricionais, como diarréia", conta Roberto Mangieri Jr. veterinário homeopata. "De lá pra cá, todos esses problemas se corrigiram", complementa.

Nilson Roberti Benites também é veterinário homeopata e afirma: "Todos os animais vivos podem ser tratados com a homeopatia: bovinos, eqüinos, cães, gatos, araras, papagaios, canários...".

Pronto, e agora? Se os animais não têm consciência de que estão sendo tratados, como dizer que a melhora foi por um simples efeito placebo? "Aliás, é muito comum se imaginar que o placebo só acontece quando você está consciente e que você vai se convencer que vai fazer feito, como uma espécie de sugestão psicológica. Não é isso. O efeito placebo ocorre com pacientes inconscientes, com crianças pequenas, e também com animais", acrescenta o professor Renato Sabbatini.

Em estudos sobre dor, por exemplo, o efeito placebo tem em média 40% de eficiência! Ele aparece também quando o ser vivo recebe cuidado e atenção. "Por exemplo, um efeito placebo de pegar o rato na mão. Com ele anestesiado, já foi comprovado que há efeito placebo. Mesmo se você abraçar um paciente inconsciente você pode ter um efeito placebo".

Os homeopatas, claro, não concordam: "Do ponto de vista do medicamento, o a homeopatia é o anti-placebo, porque o melhor placebo é colorido, de tamanho grande e tem um custo elevado. Ele é novo e com uma série de atrativos. O medicamento homeopático tem a mesma apresentação: ou é líquido, sem gosto, ou aquele glóbulo doce. Além disso, é barato", considera Flavio Dantas, professor de Homeopatia da Universidade Federal de Uberlândia.

Diante de tamanha polêmica, uma equipe da BBC de Londres decidiu fazer sua própria experiência, para provar se substâncias ultra diluídas, como os remédios homeopáticos, tem algum efeito. A supervisão é da respeitadíssima Academia Britânica de Ciências!

Está em jogo um milhão de dólares! Esse é o prêmio oferecido pelo mágico e cético James Randi a quem comprovar qualquer fenômeno ainda não aceito pela ciência. Qual será o resultado? Você vai ver no próximo domingo, no último capítulo da série "Homeopatia, o teste!". Até a semana que vem!

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