Há sete anos, a auxiliar de escritório Vanessa Morila, de
23 anos, estava à beira da morte. "Em 1997, eu descobri que
estava com uma aplasia medular, que é uma doença na medula,
onde a medula deixa de funcionar. Eu precisava de um
transplante urgente, um transplante de medula óssea".
As plaquetas, componentes do sangue que fazem a coagulação,
tinham chegado a níveis baixíssimos e fatais. "Descobri que
estava doente devido a vários sangramentos que estavam
ocorrendo diariamente na gengiva, no nariz... Era direto".
Vanessa procurou um especialista em doenças do sangue. Ela
saiu do consultório direto para o hospital. "A residente
chegou e me perguntou se eu tinha irmãs. Eu falei: 'Tenho
duas'. Ela falou: 'Que bom, então você vai precisar fazer um
transplante, senão você tem só três meses de vida'", comenta
Vanessa.
O tratamento era muito agressivo. Vanessa, na época com 17
anos, engordou 20 quilos! Para piorar, ninguém na família
tinha medula compatível com a dela. "Foi aí que, no auge do
desespero, nós procuramos uma medicina alternativa, no caso a
homeopatia, que foi a minha salvação".
O médico homeopata retirou, aos poucos, os remédios
convencionais. Vanessa continuou indo ao hematologista, mas
nunca contou a ele que também usava homeopatia. Hoje, a
contagem de plaquetas é de quase 100 mil por milímetro cúbico:
um pouco abaixo do normal, mas muito melhor do que na fase
mais grave da doença.
Vanessa diz que já teve 7 mil plaquetas no sangue - seu
nível mais baixo. Hoje, ela se considera curada."Completamente
curada!", enfatiza.
Um caso tão marcante como o da Vanessa parece prova
incontestável de que a homeopatia funciona. Mas não é bem
assim. Primeiro, porque não se faz ciência com casos isolados
- e Vanessa pode ser apenas uma feliz exceção. Segundo, os
pesquisadores dizem que é muito difícil estabelecer uma
relação direta de causa e efeito, ou seja, dizer com certeza
absoluta que a recuperação de pacientes como Vanessa se deve
exclusivamente por causa do remédio homeopático.
"Uma coisa que não engana somente os homeopatas, mas também
os médicos que eles chamam de alopatas, quer dizer, a medicina
moderna, é ter uma doença, tratá-la, e achar que foi o
tratamento. Isso não é necessariamente verdade".
Se não foi o tratamento, então foi o quê? Crítico agudo da
homeopatia, o fisiologista Renato Sabbatini tem uma resposta
surpreendente para uma pergunta direta: "A homeopatia
funciona?" "Sim, a homeopatia funciona, mas não pelos motivos
que os homeopatas alegam".
Por que funciona, então? Na visão da medicina tradicional,
por três motivos. O primeiro deles: o curso natural da doença.
"Há situações práticas em que, se você tratar ou não tratar em
três ou quatro semanas, o próprio organismo se cura", afirma
Sérgio Ferreira, professor de Farmacologia da Universidade de
São Paulo (USP).
"Os casos na área dermatológica, gastrintestinal, febre ou
infecção são doenças normalmente bastante sensíveis à reação
do organismo, e também bastante sensíveis à esfera psíquica",
explica Renato Sabbatini, que também é professor da Unicamp.
Segundo motivo: as consultas aprofundadas, de mais de uma
hora, típicas da homeopatia."Em uma consulta de homeopatia,
não perguntam o que você tem, mas sim como como vai a sua
vida", diz o músico Frejat. "É como se eles vissem um ideal de
medicina sendo praticado, e, no fim, o detalhe do medicamento
é só um detalhe'', considera o professor Renato Sabbatini.
Terceiro motivo: o efeito placebo. "Os estudos científicos
homeopáticos são frágeis. Agora, funciona? Isso é que é
difícil entender. Nós sabemos que existe o efeito placebo",
diz Sérgio Ferreira.
O efeito placebo é um dos fenômenos mais poderosos e
intrigantes da medicina. Ele acontece quando alguém toma um
remédio de mentira - sem saber que é de mentira - e mesmo
assim fica melhor. Para os críticos da homeopatia, está
resolvido: remédio homeopático, sempre superdiluído,
praticamente só água, não passa de placebo.
Mas, então, como os críticos explicam isso? Em uma fazenda
de produção de leite em Jundiaí (SP), há três anos, só se usa
homeopatia. Até em spray! "Elas não entrava no cio, não
emprenhavam e tinham alguns problemas nutricionais, como
diarréia", conta Roberto Mangieri Jr. veterinário homeopata.
"De lá pra cá, todos esses problemas se corrigiram",
complementa.
Nilson Roberti Benites também é veterinário homeopata e
afirma: "Todos os animais vivos podem ser tratados com a
homeopatia: bovinos, eqüinos, cães, gatos, araras, papagaios,
canários...".
Pronto, e agora? Se os animais não têm consciência de que
estão sendo tratados, como dizer que a melhora foi por um
simples efeito placebo? "Aliás, é muito comum se imaginar que
o placebo só acontece quando você está consciente e que você
vai se convencer que vai fazer feito, como uma espécie de
sugestão psicológica. Não é isso. O efeito placebo ocorre com
pacientes inconscientes, com crianças pequenas, e também com
animais", acrescenta o professor Renato Sabbatini.
Em estudos sobre dor, por exemplo, o efeito placebo tem em
média 40% de eficiência! Ele aparece também quando o ser vivo
recebe cuidado e atenção. "Por exemplo, um efeito placebo de
pegar o rato na mão. Com ele anestesiado, já foi comprovado
que há efeito placebo. Mesmo se você abraçar um paciente
inconsciente você pode ter um efeito placebo".
Os homeopatas, claro, não concordam: "Do ponto de vista do
medicamento, o a homeopatia é o anti-placebo, porque o melhor
placebo é colorido, de tamanho grande e tem um custo elevado.
Ele é novo e com uma série de atrativos. O medicamento
homeopático tem a mesma apresentação: ou é líquido, sem gosto,
ou aquele glóbulo doce. Além disso, é barato", considera
Flavio Dantas, professor de Homeopatia da Universidade Federal
de Uberlândia.
Diante de tamanha polêmica, uma equipe da BBC de Londres
decidiu fazer sua própria experiência, para provar se
substâncias ultra diluídas, como os remédios homeopáticos, tem
algum efeito. A supervisão é da respeitadíssima Academia
Britânica de Ciências!
Está em jogo um milhão de dólares! Esse é o prêmio
oferecido pelo mágico e cético James Randi a quem comprovar
qualquer fenômeno ainda não aceito pela ciência. Qual será o
resultado? Você vai ver no próximo domingo, no último capítulo
da série "Homeopatia, o teste!". Até a semana que
vem!