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Vitamina Também Faz Mal

Renato Sabbatini

Existe pouca gente que é contra tomar vitaminas. Esse suplemento alimentar ficou em moda nos últimos anos, e existe uma especialidade médica (medicina ortomolecular) que até recomenda megadoses de todos os tipos de vitaminas para uma miríade de coisas, desde contra o câncer, viroses e resfriados, até melhorar a sua vida sexual. Particularmente entre as mamães e os idosos, a mania virou verdadeira epidemia. Centenas de alimentos para nenês e crianças alardeiam que adicionam vitaminas aos seus preparados, e existem velhinhos que engolem dezenas de pílulas e comprimidos por dia.

A indústria farmacêutica, naturalmente, não perderia uma oportunidade como essa, e gasta muito dinheiro anunciando propriedades milagrosas para as vitaminas, como combater o estresse, "curar" gripes e resfriados e promover o crescimento. Como as vitaminas não são consideradas medicamentos (existem naturalmente em alimentos de origem animal e vegetal), não têm a sua venda regulamentada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária, e não precisam de receita. Para os laboratórios, é uma festa.

A imprensa não fica atrás em matéria de propaganda do poder das vitaminas. Quase não existe artigo sobre saúde natural que não apregoe as virtudes curativas dessa ou daquela vitamina. O mesmo acontece em revistas sobre boa forma e exercício. Afirmações sem nenhuma prova, e "chutes" desencontrados, misturando alimentos com doses artificiais, escritos por redatores ignorantes dos mais elementares fatos sobre vitaminas. Dezenas de produtos cosméticos colocam doses de vitamina A, C, D, E e outras em seus cremes e xampús. Os malhadores de academias e os adeptos da musculação engolem toneladas de aditivos alimentares ricos em vitaminas.

Em suma, a vitaminomania é um traço importante da cultura ocidental moderna. Nos EUA, 40% da população toma suplementos vitamínicos diariamente!

Mas será que é isso mesmo? Tomar megadoses de vitaminas realmente tem algum efeito?

Infelizmente as notícias não são muito boas para essa turma. Até agora pouquissimos efeitos de doses diárias aumentadas de vitaminas foram cientificamente comprovadas como tendo algum efeito benéfico. Ao contrário: existem doenças, chamadas hipervitaminoses, com sintomas e sinais muito difíceis de serem reconhecidos, que ocorrem por doses excessivas de vitaminas, principalmente as lipossolúveis (que não se dissolvem em água), pois tendem a se acumular no corpo. Quanto às vitaminas hidrossolúveis, como a vitamina C, doses muito grandes não são absorvidas pelo organismo e são jogadas fora nas fezes e urina, ou seja é dinheiro desperdiçado. Por exemplo, o corpo não consegue absorver mais do que 200 miligramas por dose de vitamina C, portanto o que o cientista Linus Pauling fazia, que era tomar até 30 gramas dessa vitamina por dia, não passava de pura enganação (apesar de ter recebido dois prêmios Nobel, e de ter morrido com 93 anos de idade…). A dosagem diária recomendada é de apenas 75 mg para mulheres e 90 mg para homens, e essa quantidade é fornecida normalmente por uma dieta bem balanceada com verduras e frutas, especialmente as cítricas.

Pior: estudos científicos recentes têm demonstrado que os comprimidos de vitamina C tomados por milhões de pessoas preocupadas com sua saúde podem causar danos ao DNA das células, modificando o código genético e aumentando a probabilidade de câncer. O ácido ascórbico age de forma muito eficiente sobre um componente produzido pelo corpo a partir dos lipídeos, chamado de hidroperóxido lipídico. Este, por sua, vez, pode ser convertido dentro das células em substâncias chamadas genotoxinas, que podem danificar o DNA, levando à reprodução anormal das células. Um outro estudo anterior, feito há cerca de dois anos atrás, mostrou de forma alarmante que pessoas que tomam doses muito altas de vitamina C têm pequenas anormalidades sangüíneas, na forma de células brancas (leucócitos) atípicos.

Quanto aos efeitos das vitaminas na recuperação de doenças, poucos foram comprovados cientificamente até hoje. A vitamina C não previne resfriados, mas parece apressar sua recuperação. Um pequeno efeito benéfico é notado também em pessoas com pressão alta ou com infecções. A vitamina E tomada em doses suplementares parece ajudar a prevenir problemas cardíacos. Mas não é muito mais do que isso.

A conclusão é que as pessoas só devem tomar suplementos vitamínicos se estiverem com alguma deficiência nutricional, por estarem fazendo dieta para emagrecer, por exemplo, ou por tendo pouco tempo para comer todas as refeições de forma balanceada. Sem dúvida nenhuma, as vitaminas estão entre as mais importantes descobertas da medicina, e seu envolvimento na bioquímica do organismo e na prevenção de doenças como escorbuto, béri-béri, pelagra, raquitismo, cegueira noturna e outras. Mas a ciência médica não dá o seu apoio ao uso exagerado por pessoas saudáveis. O excesso de aditivos vitamínicos a alimentos processados artificialmente de uso diário, como lacticinios, achocolatados, biscoitos, etc., pode levar até a um acúmulo desnecessário.



Publicado em: Jornal Correio Popular, Campinas, 15/06/2001.
Autor: Email: renato@sabbatini.com

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