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Internet: necessidade ou vício?

 

Renato Sabbatini

Se você fosse morar em uma ilha deserta, o que preferiria, se pudesse escolher: ter uma TV, uma linha telefônica ou um micro com acesso à Internet? Se você respondeu a última alternativa, parabéns. Em pesquisa de opinião realizada pela gigantesca America On Line (AOL), o maior provedor Internet do mundo, em dezembro do ano passado, 67% dos seus usuários disseram que prefeririam a Internet. Em segundo lugar ficou o telefone, com 23% e em último a TV, com meros 9% (o que diz muito a respeito do conceito que os interneteiros têm a respeito da TV). Uma escolha racional, afinal das contas, porque qualquer um sabe que hoje se pode telefonar e assistir a TV através da Internet…

A conclusão do estudo é que para esse grupo de pessoas, a Internet é uma necessidade fundamental (87 % disseram que sentiriam muito a falta de acesso on-line, e 64% acham que não conseguiriam mais viver ou funcionar sem a Internet…). E pode ser um vício também, como mostraram vários estudos, que descobriram pessoas que passam regularmente oito horas por dia, ou mais, plugados na rede. Pasmem: a pesquisa da AOL mostrou que 47% dos seus usuários levam um computador consigo quando passam férias!

A que grupo você pertence? Eu confesso ser altamente dependente da Internet, mas acredito não ser um viciado… Uso a Internet praticamente durante todo o dia, mas porque ela é minha principal linha de pesquisa acadêmica, e porque na UNICAMP temos conexão dedicada direta, 24 horas por dia (que delicia, hem??). Também não conseguiria mais sobreviver profissionalmente sem a Internet, principalmente porque eu substituí todos os meus sistemas de comunicação e acesso à informação anteriores (carta, fax, telex, biblioteca, e, em boa parte, telefone) pelos seus correspondentes digitais (email, Web, chat, etc.).

A Internet pode ser um perigosissimo desperdiçador de tempo, se você não souber controlar impulsos e aprender técnicas de uso eficiente. Por causa disso, muitas empresas em todo o mundo estão limitando o acesso de seus funcionários à Internet, depois de terem passado por uma fase de liberalização excessiva. Descobriram que alguns deles torravam horas e horas, e recursos preciosos de acesso à informação da companhia, batendo papo em chats, escrevendo longas mensagens para grupos de notícias ou listas de discussão, ou vagando pela Internet à busca de informação desnecessária ou difícil de achar. Até existe um termo para esse tipo de pessoa viciada em dados: "dataholic".

Se sua empresa está nessa situação, existem diversas medidas que podem ser tomadas. A primeira é ter um código de conduta a respeito do uso da Internet, que todos funcionários devem conhecer e assinar. Por exemplo, somente usar quando há uma necessidade legítima ligada à atividade do funcionário da empresa. Se ele quiser acessar a Internet por hobby ou curiosidade, participar de bate-papos ou ficar escrevendo emails para amigos, que assine um acesso através de um provedor privado e que faça isso em casa, fora do horário de trabalho.

Mas como a natureza humana é difícil de dobrar, algumas armadilhas técnicas podem facilitar a obediência às normas… A mais óbvia é instalar um "firewall" na rede da empresa. Trata-se de um software que barra a entrada ou saída de certas mensagens, usuários, domínios ou protocolos, com base nos seus endereços. Por exemplo, uma empresa pode barrar o acesso à sites de cassinos on-line ou serviços noticiosos, servidores de vídeo, canais de chats, etc.

Uma outra alternativa é usar browsers (os navegadores da WWW, como o Netscape) especialmente desenvolvidos para funcionar apenas dentro da intranet da empresa (a rede própria de informações) e impedir a navegação externa. Alguns usuários podem receber autorização para entrar na Internet irrestritamente, devido à natureza de suas funções (pesquisadores de novos produtos, por exemplo). Em muitas empresas americanas, apenas 2 a 5% dos funcionários detêm esse privilégio. Em um hospital da Universidade da Califórnia, um browser especialmente desenvolvido permite o acesso dos médicos e enfermeiras apenas aos registros médicos dos pacientes e a alguns serviços informativos externos, como bancos de dados de medicamentos, de bibliografias médicas, etc.

O terceiro método, e o mais efetivo, na minha opinião, é dar um bom treinamento a todos os funcionários. Cerca de 90% dos usuários diz que gostaria de fazer um curso de como usar eficientemente a Internet, mas pouquissimas empresas oferecem esses cursos. Fico espantado de ver como as pessoas que usam a Internet corriqueiramente, até mesmo alguns que se julgam veteranos, usam mal os mecanismos de busca. Como resultado, passam um termo enorme procurando (e não achando…) informações relevantes para uma determinada necessidade. É generalizada a ignorância acerca das fontes de informação mais eficientes em sua própria área de trabalho. Toda pessoa deve tentar acumular uma lista de "bookmarks" de recursos que rendam resultados altamente focalizados e específicos para determinadas necessidades, assim como alguns sites do tipo "pau prá toda obra", ou seja, que resolvem muitas necessidades de busca. Um dos meus favoritos é o iTools, que concentra uma enorme quantidade de serviços de busca de toda natureza em um único lugar.

Com o crescimento cada vez maior da quantidade de informação disponível na Internet, as coisas só tendem a piorar nesse aspecto. O treinamento dos usuários deve se tornar uma meta prioritária, é o que defendem todos os especialistas no ramo.
 

Para saber mais



Renato M.E. Sabbatini é professor e diretor do Núcleo de Informática Biomédica da Universidade Estadual de Campinas, colunista de ciência do Correio Popular, e colunista de informática do Caderno Cosmo. Email: sabbatin@nib.unicamp.br

Veja também: Índice de todos os artigos anteriores de Informática do Dr. Sabbatini no Correio Popular.



Publicado em: Jornal Correio Popular, Campinas, 8/5/1999.
Jornal: Email: cpopular@cpopular.com.br
WWW: http://www.cosmo.com.br


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