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Agência de Publicidade ou Editora?

 

Renato Sabbatini


Um número cada vez maior de empresas está agregando a Internet e a WWW às suas estratégias de propaganda, marketing e vendas. A primeira providência é quase sempre elaborar uma home-page, registrar um domínio que lembre o nome da empresa, e torná-los disponíveis na Web. Atualmente não é necessário possuir um servidor permanentemente conectado à Internet para isso: basta contratar a hospedagem, o registro de domínio e até a elaboração da home-page com uma das centenas empresas provedoras especializadas. É uma solução barata, mas não é nada mais do que um simples "folheto eletrônico" de apresentação da empresa, seus produtos e serviços, dados para contato, etc. Eu diria que 90% dos sites de empresas brasileiras não passam disso.

Como essa estratégia é muito parecida com a de publicidade e divulgação da empresa seguida em as outras mídias, é natural que esteja ocorrendo uma tendência muito forte: as agências de publicidade tradicionais estão aos poucos conquistando as "contas para a Internet", também. Elas acenam com um argumento muito forte para as empresas: o de que uma abordagem integrada a todas as atividades de propaganda, incluindo mídias impressas, rádio, TV, outdoors e Internet, devem ser elaborada por uma única agência. Desse modo, ela terá condições de trabalhar os aspectos de campanhas, texto e visual da empresa a partir de uma única criação.

O argumento, naturalmente, está tirando o trabalho de muita gente que se dedica exclusivamente à elaboração de websites. No entanto, trata-se de um erro crasso! E vou explicar por que.

A Internet não é (apenas) um meio de publicidade. Aliás, como veículo, é reconhecidamente ineficaz, pois é de visita voluntária. E pouca gente se submete voluntariamente a uma propaganda, como sabe qualquer estudante de primeiro ano. A maioria dos websites de empresas que se preocupa apenas com o aspecto do "folheto eletrônico" é um completo fracasso, tendo poucas visitas, e acaba se estagnando, obtendo pouca valorização, até mesmo internamente na empresa.

A razão é que a Internet, e especificamente a Web, exigem estratégias que são mais parecidas com uma editora do que com uma agência de publicidade. Ou ainda, cada vez mais, com um posto de serviços ao cliente. E você, como empresário, jamais confiaria à sua agência de publicidade a edição de um livro ou revista, ou a operação de um Serviço de Atendimento ao Consumidor, certo?. Isso não pertence à sua área de competência, principalmente quando o conteúdo e os serviços a serem disponibilizados são muito especializados.

Tomemos o exemplo de uma indústria farmacêutica que conheço (sem citar o nome). Inicialmente, a empresa decidiu-se por contratar uma empresa especializada no desenvolvimento de websites para o setor farmacêutico, pois desejava oferecer publicações eletrônicas, serviços de conectividade e comércio eletrônico "business-to-business" para o segmento médico-hospitalar, que gera 99% de seu faturamento atual. Para isso, é essencial o envolvimento de especialistas médicos (para redigir os artigos, por exemplo, ou coordenar os "chats" e fóruns on-line), e de pessoas com amplos conhecimentos de implementação de sistemas de comércio eletrônico e logística na área.

Infelizmente, empolgada pelas possibilidades de elaboração visual do site, e decidida a fazer um folheto on-line tão bonito quanto o que tem impresso, cancelou o contrato e resolveu dar a tarefa à sua agência de publicidade (que convenceu os diretores de marketing da indústria farmacêutica usando o argumento acima). O resultado: um desastre. O site atual é lindíssimo, cheio de animações e efeitos multimídia em Flash. Certamente vai ganhar algum prêmio de design (dado por publicitários...). Mas, esses mesmos efeitos afastam imediatamente o usuário, que a partir da segunda vez que acessa o site, se cansa de esperar. O conteúdo médico propriamente dito foi grandemente reduzido na nova versão, pois ninguém, nem dentro da empresa, nem na agência de publicidade, tem competência para levá-la adiante. O mesmo aconteceu com os planos de comércio eletrônico, que foram adiados indefinidamente. Além disso, o site custou muito caro e demorou uma enormidade para ficar pronto, afetando negativamente a imagem da indústria farmacêutica no mercado.

Moral da história: enquanto as empresas não reconhecerem o fato de que a Internet opera um processo inteiramente novo, e que não se trata da mídia tradicional vestida em novas roupas, vão continuar a ocorrer esses equívocos. E as empresas não vão conseguir aproveitar todo o potencial oferecido pela Internet, perdendo competitividade e deixando de lado uma verdadeira estratégia voltada à uma "presença Internet", mais completa do que a mera publicidade.



Renato M.E. Sabbatini é professor e diretor associado do Núcleo de Informática Biomédica da Universidade Estadual de Campinas, colunista de ciência do Correio Popular, e colunista de informática do Caderno Cosmo. Email: sabbatin@nib.unicamp.br

Veja também: Índice de todos os artigos anteriores de Informática do Dr. Sabbatini no Correio Popular.



Publicado em: Jornal Correio Popular, Campinas, 19/5/2000 .
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