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Ciência e Tecnologia em 2000

Renato Sabbatini

No último ano do século aconteceram muitos avanços significativos na ciência e na tecnologia. Como já é tradicional nesses nove anos em que escrevo para o Correio Popular, a coluna de hoje vai revisar alguns daqueles que foram considerados pelos cientistas como sendo os mais importantes.

O mais espetacular de todos, sem dúvida, foi o término do seqüenciamento do genoma humano, o mapa completo do DNA contido em nossas células. No dia 26 de junho correu pelo mundo a notícia que 97% do genoma já tinha sido mapeados, vários anos antes do término previsto. As repercussões desse marco foram imensas. Embora ele seja quase que apenas de valor simbólico (a maioria dos mais de 100.000 genes segue desconhecida, pois não se sabe a que segmentos de DNA os mesmos pertencem), tanto cientistas quantos leigos e jornalistas fizeram grande alarde, chegando mesmo os cientistas-chefes dos dois principais grupos competidores (NIH e TIGR) a aparecer juntos em uma cerimônia pública de homenagem, ao lado do presidente dos EUA e do primeiro-ministro inglês.

Ainda no campo da biologia, a novidade mais espetacular disse respeito às células-tronco, que são células em um estágio primitivo de desenvolvimento, que são as precursoras de todas as demais, como células musculares, cerebrais, etc., em um processo chamado de diferenciação celular. Pesquisadores na Inglaterra descobriram uma maneira de transplantar células-tronco de uma parte do corpo para outra. Dessa forma, eles foram capazes de gerar novos neurônios (células cerebrais), uma capacidade que é perdida pouco depois do nascimento nos seres humanos. Essa descoberta tem um enorme potencial para a medicina, pois permitirá a reconstrução de partes perdidas do corpo, ou tecidos degenerados por doenças, como as de Alzheimer e de Parkinson, que vitimam centenas de milhares de pacientes por ano.

Outra descoberta muito importante foi a de fósseis de um do nosso ancestral mais antigo achado até agora, um hominídio que viveu há seis milhões de anos atrás, em um vale no que hoje é a Quênia, e que parece ter sido o berço da humanidade (o mais antigo descoberto até hoje tinha cerca de 4,5 milhões de anos). Os ossos das pernas e dos quadris indicam que esse hominídio já andava de pé, mas provavelmente não todo o tempo. Estamos cada vez mais perto de acharmos o famoso "elo perdido", ou seja, o fóssil do ancestral comum entre o ramo dos antropóides (os macacos mais semelhantes aos seres humanos, como o chimpanzé e o gorila) e o ramo dos seres humanos (gênero Homo).

Na área de ciência espacial e astronomia tivemos v& Estação Espacial Internacional (ISS), com o envio de seis tripulações de montagem e construção, e o estabelecimento da primeira tripulação residente, em novembro. Essa estação, embora seja polêmica e de custo muito elevado, será extremamente importante para as ciências espaciais e da Terra, pois será um laboratório permanente de observação do cosmo e do planeta, seus recursos naturais, etc., além de poder tornar mais extensas e detalhadas as experiências do efeito de longas permanências de seres humanos em gravidade zero, essenciais para o planejamento da primeira viagem tripulada para Marte, dentro de uns 20 anos. Do ponto de vista simbólico, é interessante que o famoso livro de ficção científica de Arthur Clarke (e cult-film), "2001 no Espaço" já previa estações espaciais desse tipo, embora muito maiores e complexas. Entre as previsões que não deram certo, no entanto, está a de que já teríamos linhas aéreas comerciais para o espaço em 2001, que haveriam colônias habitadas russas e americanas na Lua, e que teríamos a capacidade de fazer vôos tripulados até Júpiter. Com certeza foi o fim da Guerra Fria e a falência do sistema soviético que acabou inibindo a competição entre as grandes potências e levando a um esfriamento da corrida espacial.

Com relação ao meio ambiente, a notícia mais importante foi negativa: o aquecimento global da Terra continua a progredir em velocidade assustadora. Extenso derretimento de geleiras em montanhas (levando a uma freqüência recorde de deslizamentos e avalanches) e de plataformas de gelo e icebergs tanto nos dois Pólos chamaram a atenção da mídia e dos cientistas ao longo do ano 2000. No entanto, a reunião de estratégia global em Haia, para cortar as emissões dos chamados "gases de estufa", como metano, monóxido e dióxido de carbono, pelos paises industrializados não deu em nada. Como escrevi em um dos meus artigos no Correio sobre o assunto, essa tese de aquecimento provocado pela atividade de queima de combustíveis fósseis e queimadas pelo ser humano é muito polêmica. Existem cientistas que defendem que existe um ciclo natural de aquecimento e resfriamento da Terra, muito impredizível, e largamente determinado por fatores conhecidos, como os ciclos solares, ou desconhecidos, é o responsável por essa flutuação. Os ecoativistas, no entanto, apontam a correlação quase perfeita que existe entre a temperatura média e o nível dos "gases de estufa" como um indício da culpa da atividade econômica na história.

Trata-se de uma ameaça para a sobrevivência das espécies no planeta, inclusive o homem? Não sabemos. Já tivemos flutuações de temperatura que excederam 20 graus no passado, sem que a vida fosse interrompida. Os números previstos para o decorrer do século 21 são muito menores: 5 a 7 graus de aumento, segundo os mais pessimistas.

Infelizmente, continua a destruição do meio ambiente e das espécies. O ano de 2000 presenciou um triste marco: a primeira espécie de primata (macaco colobus vermelho) a desaparecer inteiramente da face da terra. Seremos nós um dos próximos primatas a se extingüirem?

Para Saber Mais


Correio PopularPublicado em: Jornal Correio Popular, Campinas,  05/01/2001.

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