O Globo
Seção: Jornal da Família
Página: 2
Data: Domingo, 2 de julho de 2000
Autor: Antonio Marinho e Maria Elisa Alves
O médico virtual
Especialistas alertam sobre os cuidados com os serviços
de medicina na rede
A cada dia, mais pacientes têm recorrido ao mouse na hora
de consultar um médico. A troca dos consultórios reais pelos virtuais é
espantosa: somente um dos sites que dá orientações sobre endocrinologia
atendeu, no mês passado, 80 mil pessoas. Endereços eletrônicos que
oferecem informações de mais de uma especialidade médica chegam a Ter
150 mil acessos por mês. O sucesso, porém, acendeu um sinal de alerta
nos conselhos de medicina. O Cremerj, por exemplo, acaba de criar a
Comissão de Informática Médica, para controlar a propaganda médica na
Internet e coibir a propaganda médica de medicina.
- Estamos preocupados com a qualidade dos serviços oferecidos pela
Internet. Com a comissão, queremos fiscalizar a venda de medicamentos
e as cobranças de consultas virtuais – diz Ruy Haddad, do Cremerj.
O conselho está atento para que não se repitam casos como a da médica
Bernadete Angeli, do Rio Grande do Sul. Ela foi pressionada a retirar do
ar seu site, onde "atendia" os internautas mediante o pagamento de
R$60,00. O cliente devia preencher uma ficha de cadastro, pagar e
descrever os seus sintomas. Em troca, recebia diagnósticos e até mesmo
receitas de remédios, enviados pelos correios. Outro caso que provoca
polêmica é do anestesiologista José Renato Pedroza, que indica a
anestesia mais adequada aos pacientes que preenchem uma ficha no
computador com os seus dados clínicos e resultados de exames de
sangue.
- Na Internet, o médico não tem como fazer o exame clínico físico. A
consulta virtual infringe o código de ética médica. Não tenho nada
contra as páginas que apenas orientam o paciente a procurar um
especialista e tiram dúvidas sobre determinados assuntos – diz o
presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), Edson Oliveira
Andrade.
O médico Renato Sabbatini, criador do Hospital Virtual Brasileiro,
também alerta sobre o risco das consultas virtuais.
- O que pode ser feito pela Internet é a orientação geral, o
fornecimento de informações médicas básicas. Mas é importante que o
usuário reconheça se o profissional é competente pelo nome, currículo
e afiliação acadêmica ou hospitalar. Essa informação não pode ser
anônima e o médico que a respondeu deve se identificar e publicar seu
currículo na Internet- recomenda Sabbatini.
Para quem procura informação médica de qualidade, Sabbatini recomenda
os sites criados por universidades de renome:
- Os sites de indústrias farmacêuticas podem ser bons ou suspeitos,
dependendo da insenção ética com que tratam as informações sobre os
medicamentos poduzidos. Sites do governo de boa qualidade, como o site
sobre Aids, do Ministério da Saúde, também são uma boa indicação.
Recomendo os do Hospital Virtual Brasileiro, feito pela Unicamp.
O que é confiável para o Conselho Federal de
Medicina
Consultas: O conselho orienta os internautas a jamais procurar sites
que ofereçam diagnósticos e receita em consultas virtuais. Nada
substitui o exame clínico real com um médico.
Testes: Algumas sociedades médicas oferecem testes sobre os riscos de
se contrair doenças, com base em informações sobre histórico familiar e
hábitos pessoais. A Sociedade Brasileira de Cardiologia tem no seu site
uma avaliação do risco de doença coronariana.
Simulações: A Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica e Conselho
Federal de Medicina condenam o uso de simulações de cirurgias para
leigos feitas em computador. A simulação dos efeitos de uma plástica,
por exemplo, fere o código de ética médica.
Prescrição: A prescrição de remédios pela Internet, sem exame clínico
do paciente, é caso que deve ser denunciado ao Conselho Regional de
Medicina de cada estado.
Medicamentos: As farmácias virtuais precisam seguir as mesmas regras
das drogarias da esquina. Se uma farmácia oferecer remédios que precisam
ter a receita médica retida sem exigir o documento, desconfie e não
compre.
Exames: Receber pela Internet o resultado de exames laboratorias ou
laudos de exames feitos ao vivo é prática considerada segura. Os
laboratórios fornecem senha para acessar o resultado e garantir a
privacidade do cliente.
O que virá
- Telediagnóstico: é a digitalização e envio de sinais biológicos
por via telefônica, desde o local onde o paciente se encontra, a um
centro especializado. É possível fazer eletrocardiograma,
eletroencefalograma, entre outros exames. Para acompanhar gravidez de
risco, haverá um sistema para monitorar os batimentos cardiofetais e
as contrações uterinas na própria residência.
- Teleconsulta: Permitirá a transmissão a qualquer distância de
radiografias, tomografias, cintilografias, ecografias e outras
imagens. O sistema contará com câmara, microcomputador e modem.
- Teleanálise: um microcomputador fará a coleta e transmitirá dados
de química sangüínea para o computador de um especialista.
- Telecirurgia: Um cirurgião italiano, em Milão, operou uma cobaia
na Califórnia usando luvas de posicionamento digital, que sentem e
transmitem para o computador a posição espacial exata das mãos do
cirurgião e a movimentação dos dedos; e um capacete de visão
binocular, dotado de telas de computador que transmitiam uma visão
tridimensional do campo operatório. O médico usou à distância mãos
robóticas para segurar instrumentos cirúrgicos. Sistemas semelhantes
foram desenvolvidos pela NASA para socorrer astronautas.
Especialistas não aprovam consulta virtual
No Brasil, a informática aplicada à medida é mais usada para o
aperfeiçoamento de profissionais de saúde
Outro cuidado que se deve Ter é em relação à venda de medicamentos
pela Internet. Segundo o presidente do Conselho Federal de Medicina,
alguns sites podem estimular a automedicação. Édson diz que o serviço de
venda de remédios na rede deveria ser, como as drogarias de verdade,
fiscalizado pela Vigilância Sanitária. Outro problema que Édson cita é
em relação à veracidade das informações prestadas nos endereços da
rede:
- A consulta virtual não inspira confiança. Além disso, o paciente
não tem certeza sequer se está conversando com um médico de verdade –
diz.
Cirurgião analisou caso de paciente pela Internet
Para o presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (seção
RJ), o cirurgião José Horácio Aboudib, há casos em que a medicina
virtual ajuda e outros em que é um desastre. Ele cita como o lado bom da
informática a troca de informações, feitas por e-mail, entre médicos do
interior e de grandes centros de pesquisa. E conta que já usou a
Internet para "consultar" uma paciente que estava em Manaus.
- Eu a operei no Rio e ela viajou de volta para Manaus, onde mora.
Ela me ligou reclamando que estava muito inchada, com rosto todo roxo.
Como eu tinha como avaliar por telefone, pedi para ela mandar uma foto
pela Internet. Quando vi a imagem, percebi que o problema era normal
após a cirurgia que ela fez e a tranqüilizei. Em outra época, ela
teria que ficar no Rio durante o pós-operatório.
O cirurgião é contra sites que simulam imagens, como o que mostra
como poderia ficar o nariz de uma pessoa após uma cirurgia plástica:
- No computador, posso fazer o que quiser, desenhar o nariz de modos
surpreendentes. Na vida real, nunca vou conseguir efeito igual. Por
isso, é melhor que o paciente se iludir e ficar insatisfeito depois
com o resultado da plástica – diz.
No meio da polêmica, há espaço para sites que não oferecem risco. O
Guia do Bebê, por exemplo, criado pelo pediatra Ruy Pupo, foi premiado
pelo Ibest, considerado o Oscar da Internet, por prestar serviços de
qualidade às mães. No site, há artigos de interesse geral, como os
cuidados que as crianças devem tomar no inverno. Apesar de tirar
dúvidas, Pupo frisa que suas respostas não substituem a consulta ao
médico:
- Recebo cerca de 50 e-mails por dia com várias dúvidas. Há pessoas
que descrevem sintomas de seus filhos à espera de diagnóstico. Não
posso fazer isto nem receitar remédio. Meu site dá orientações
genéricas. Tiro dúvidas de mães que querem saber, por exemplo, o que
provoca cólicas no bebê. Jamais poderei receitar remédio para as
mesmas cólicas – diz Pupo.
A médica Ilana Polistchuck, editora do Medcenter Saúde, diz que parte
dos usuários de sites de saúde são pacientes em busca de informações
sobre doenças crônicas e raras. A maioria, porém, quer saber mais sobre
nutrição e qualidade de vida.
- Não oferecemos consulta virtual porque achamos que isso não é
ético. Acreditamos que os pacientes devem estabelecer relação com seus
médicos. Nos artigos, orientamos os usuários a procurar atendimento. E
não vendemos medicamentos pela Internet – diz Ilana.
O site Planeta Vida é outro que é útil não oferece riscos. Ele traz
orientações e tem a seção "Fale com o doutor", na qual os usuários tiram
dúvidas com 23 especialistas. O médico Ricardo Garcia, um dos
coordenadores do site, diz que os consultores não fazem diagnóstico e
não oferecem tratamentos on line:
- Tentamos esclarecer as dúvidas e pedimos para as pessoas
conversarem com seus médicos. Alguns, porém, insistem em pedir
receitas ou dicas de tratamentos, mas não podemos fazer isso.
A medicina à distância tem ainda outras aplicações, principalmente
quando se trata do aperfeiçoamento dos profissionais de saúde.
- Embora a tecnologia nunca vá substituir o ensino em sala de aula,
muitos outros a teledidática e a telemedicina usada no contexto
educacional são úteis, principalmente para a continuidade da formação
dos médicos longe das grandes capitais. A educação continuada à
distância já é um mercado de centenas de milhões de dólares nos
Estados Unidos, graças à Internet e á videoconferência – diz o médico
Renato Sabbatini, professor de informática médica na Unicamp.
Cirurgia à distância é experimental
Sabbatini acrescenta que a telemedicina no Brasil ainda está no
começo:
- Utiliza-se muito o sistema que não necessita tempo real e pode
usar a Web, o correio eletrônico ou as conexões ponto a ponto. Também
está começando a se utilizar a Internet para serviços de Segunda
opinião médica.
A videoconferência, devido ao seu custo, é realizada por um número
pequeno de hospitais, como o Hospital Sirio-Libanês de São Paulo, o
Instituto de Cardiologia do Triângulo (em Uberlândia) e a rede de
hospitais Sarah Kubitscheck, pioneiros nessa área. Já existem várias
empresas que oferecem serviços de monitorização eletrocardiográfica via
telefone. No Brasil ainda não há tecnologia para realização de cirurgias
à distância. Mesmo no resto do mundo isto é experimental.
Os sites médicos mais procurados
- Hospital Virtual: O Hospital Virtual (http://www.hospvirt.org.br/)
foi criado pelo Núcleo de Informática Biomédica da Unicamp e visa ao
intercâmbio de informações de saúde. Está dividido em especialidades.
- Medcenter: O Medcenter (http://www.medcenter.com/) tem
novidades sobre prevenção, diagnósticos e tratamentos, fórum e testes
de risco para doenças.
- Adolescentes: Os sites (www.bireme.bnr/bvs/adolec)
e (http://www.adolesite.aids.gov.br/)
têm apoio do Ministério da Saúde.
- Bebês: Para aprender a cuidar dos bebês, há o Guia do Bebê (http://www.guiadobebe.com.br/)
e o (http://www.sbp.com.br/), da
Sociedade de Pediatria.
- Câncer: O site do Instituto Nacional de Câncer (http://www.inca.org.br/) traz tudo
sobre prevenção, diagnóstico e tratamentos, além de links para outros
sites.
- Coração: A página da Sociedade Brasileira de Cardiologia
(www,cardiol.br) traz teste para avaliar o risco e ensina a prevenir
doenças.
- Emagrecimento: Os sites Emagrecimento On Line (http://www.emagrecimento.com.br/)
e Emagrecendo (http://www.emagrecendo.com.br/)
discutem os tratamentos da obesidade com a chancela da Associação
Brasileira para Estudos sobre Obesidade.
- Medicina: O site da Universidade Johns Hopkins (http://www.jhu.edu)/, nos Estados
Unidos, tem informações sobre medicina, links para pesquisas e
publicações nas áreas médicas.
- Universidade: A página da Escola Paulista de Medicina/Unifesp (http://www.epm.br/) dá orientação sobre
prevenção de doenças.
- Planeta Vida: O site do Planeta Vida (http://www.planetavida.com.br/)
ensina a cuidar do corpo e a prevenir doenças. Tira dúvidas sobre de
sexualidade e nutrição, tem tabelas de calorias e de vacinação.