Domingo, 21 de julho de 2002 - 10h15     


   Internet


As (des)elegâncias do mundo cibernético 

São PauloA correspondência pela internet segue os mesmos princípios da etiqueta à mesa. Todo mundo usa garfo e faca, mas nem todos com a devida fineza. Se falar de boca cheia é uma das grandes grosserias que se pode cometer, ESCREVER EM LETRAS MAIÚSCULAS é considerada a pior gafe do mundo cibernético. Aparece em primeiro lugar nas listas de "netiquette", ou etiqueta na rede.

"Significa que você está gritando", diz o professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Renato Sabbatini. Portanto, aí vai a regra número 1: a menos que a intenção seja mesmo soltar uns berros virtuais, nunca mande uma mensagem grafada em letras maiúsculas. Imagine o espanto do destinatário na frente do outro monitor.

Meio rápido e fácil, disponível a qualquer momento, a internet induz a uma certa informalidade no tratamento. "Isso deve ser evitado, principalmente no primeiro contato e se você não conhecer a pessoa", diz Suzana Doblinski Joehr, consultora especializada em etiqueta empresarial e flexibilidade cultural que mora em Vevey, na Suíça. "A informalidade brasileira acaba extrapolando os limites na internet."

É natural que a informalidade seja o tom dominante nos e-mails, já que, muitas vezes, eles substituem ligações telefônicas. Transformam-se em diálogos trocados em doses homeopáticas durante o dia. Chegam ao extremo - piada que já circula há anos na internet - quando uma pessoa manda um recado perguntando se seu colega estaria interessado em almoçar, apesar de o tal colega se sentar na mesa ao lado.

"A internet é mais parecida com o telefone. É ágil, sem protocolos", diz Teresa Roza, engenheira sanitarista que trabalha em uma multinacional.

Acostumada a se corresponder a trabalho via e-mail, Teresa é uma internauta elegante. Não repassa mensagens compridas ou carregadas, raramente envia piadinhas e toma cuidado com o que escreve. Apesar de não haver regras claras nas empresas quanto ao uso do e-mail, não dá para esquecer que eles são um meio de comunicação aberto, que pode ser visto pelos patrões. Como lembra Suzana, é bom evitar mensagens confidenciais, já que um e-mail é como um cartão-postal: não tem envelope.

Limites corporativos à parte, para Suzana e os decálogos sobre netiquette encontrados na rede, o pecado capital é fazer mau uso do português, esquecendo concordâncias básicas. "As regras gramaticais existem e não podem ser esquecidas nos e-mails", diz. "A ´elegância´, assim como ortografia e gramática corretas, é importante", ensina um dos decálogos da rede.

A velocidade da comunicação faz o mouse correr logo para clicar em "enviar a mensagem", mas é melhor refrear o impulso e reler antes o que foi escrito.

Mesmo porque, alertam os especialistas, um recado enviado pela internet pode ficar armazenado por muito tempo, e qualquer deslize, gramatical ou de humor, pode ficar como prova e ser tirado do baú mais tarde. "Lembre-se: o que você escreve é um reflexo da sua personalidade", diz Suzana.

Apesar de pregar o bom uso da gramática, os especialistas recomendam que se evitem acentos e caracteres específicos de determinada língua, como o "ç" em português. O problema é quando a mensagem é enviada a países que não têm o mesmo tipo de acentuação ou pontuação (em geral, caracteres que não sejam ASCII). Nesses casos, o texto pode virar "grego", mostrar sinais incompreensíveis para quem o recebe. Não custa lembrar que, em mensagens a compatriotas, a correta utilização de acentos e letras especiais é essencial e fundamental para manter não só a compreensão fácil do texto como o bom conceito que o endereçado faz dos dotes gramaticais do remetente.

Os "smileys", marcas de pontuação que formam expressões como o sorriso :-) são bem difundidas, mas outras abreviações chegam a ser crípticas. Ou derivam do inglês. BTW são só letras sem sentido para quem não sabe que significam "by the way" ou "a propósito".

Dimensão
Em algumas listas de netiquette aparece a recomendação de evitar linhas de texto com mais de 65 ou 70 caracteres - cerca de dez palavras, em média. Isso porque a formatação da mensagem pode se perder no envio da mensagem, dificultando sua leitura. Mas o que realmente atrapalha quem necessita do correio eletrônico para trabalhar são mensagens longas. Quando se recebem dezenas ou centenas de e-mails por dia, qualquer leitura tem de ser feita necessariamente em alguns segundos.

Além disso, é preciso evitar anexos e mensagens "carregadas". "As pessoas mandam ´attachments´ sem necessidade", diz Sabbatini. Muitas vezes as mensagens carregam pesos que nem o próprio remetente percebe, como assinaturas ou desenhos bonitinhos para compor a página. "O pior de tudo é receber um e-mail enorme e ficar pagando pulsos da linha telefônica para receber."

Se for imprescindível recorrer a textos longos, pergunte antes se o computador do destinatário tem capacidade para abrir o pacote. "Seja o mais conciso e objetivo possível", ensina Suzana. "Se você não liga para o seu tempo, ligue para o dos outros." Nessa mesma categoria, de perda de tempo, estão os telefonemas para se certificar se a pessoa recebeu o e-mail.

Teresa acrescenta outro item à lista: gente que responde recados numa mensagem nova. "É chato quando a pessoa não responde no mesmo e-mail", diz.

Responder na mesma mensagem facilita a vida de quem recebe a resposta, porque permite conferir o histórico da troca de correspondência. "Dá uma continuidade para todas as pessoas que acompanham o assunto. 

Laura Knapp 


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